quinta-feira, 10 de março de 2011

Timpin na Estrada - Segunda Estação: Recife, parte 3

E às seis da manhã, no aeroporto do Recife, eu cheguei e caguei. Se tem um órgão de meu corpo que não costuma me deixar na mão, é o sistema intestinal. Toda manhã, logo depois do canecão de café e do cigarro, vem o cagão. Em Salvador isso não rolou, mas foi só chegar no Recife e aspirar o ar familiar de uma cidade onde já morei, que a rotina se fez valer. Foram onze minutos redentores no sanitário masculino do segundo piso.

Feito isso, o próximo passo era dar prosseguimento à resolução dos aspectos práticos pendentes da viagem. A saber, conseguir dinheiro para comer e um canto para dormir. O canto para dormir estava parcialmente esquemado, já tinha ligado para o amigo e padrinho de casamento Petrúcio, avisando que iria pra lá. O diacho é que estava chegando com cinco dias de antecedência.

Já a questão do dinheiro, cabe aqui uma informação que tenho a mais absoluta certeza de que após escrevê-la, o leitor pensará que sou bem mais imbecil do que imaginavam inicialmente. Eu estava sem o cartão magnético do banco para sacar o dinheiro no caixa eletrônico. Desde dezembro que o cartão está com minha esposa, que viajou com nossos filhos para o interior de Pernambuco pra passar uns tempos com a familia.

Tentem me entender. Eu achava que em Salvador conseguiria um camarada que me passasse o número de uma conta, para minha esposa depositar o dinheiro que Dan Ventura havia me depositado. Simples assim. Só que a vida é sempre mais compicada...


Dan Ventura, patrono supremo de minha viagem tinha me ajudado. Quem não se ajudou fui, saindo sem cartão. Ele canta no Bonde do Maluco e quem dá uma de maluco sou eu.


Minha idéia então era ir ao banco e inventar uma história triste de que era um turista incauto que havia sido assaltado e que precisava sacar dinheiro mostrando a carteira de identidade e digitando a senha. Só que para levar a cabo esse plano genial, precisava esperar a agência abrir, ou seja, mais quatro horas com uma fome que me corroia as entranhas.

Aberta a agência, mais perrengue. O primeiro foi que era dia de pagamento de bolsa-familia, aposentadoria ou sei lá o quê e a porra da agência estava apinhada de gente. Cada qual mais perdido que o outro, sem saber em que fila quilométrica entrar. Lá pelas onze e meia da manhã chego na boca do aixa e o segundo perrengue, só podia sacar R$100,00. Mas, como para quem não tem o que vem, vem bem, catei os cenzão e saí do banco mais feliz que lambari depois de enxurrada.

Desde a Bahia que eu estava em um jejum musical auto imposto. Preparei uma play list incluindo Kelvis Duran, Tayrone Cigano, Conde & Banda Só Brega e Labaredas da paixão, para ir me sintonizando com a cidade. Recife tem uma cena brega que é totalmente endêmica e viva. Claro, isso no ponto de ônibus onde aguardava a condução que me levaria ao Mercado de Afogados, onde tiraria a barriga da miséria.



Devorei três pratos feitos no valor de R$6,00 a unidade. Dois de galinha cabidela e um de carne frita. Não dispensei nem a farinha, que nunca costumei comer muito. Umas quatro garrafas de Coca-cola com muito gelo completaram o banquete. Palitei os dentes e cendi um cigarro me sentindo novamente um Rei. As coisas estavam voltando para seus devidos lugares.

Quer dizer, mais ou menos. Nem o Petrúcio e nem a esposa deles atendiam o celular. Eu sabia qual era o bairro onde eles moravam, mas não sabia nem que ônibus pegar e nem onde era a nova casa deles. Por isso, me dicidi por primeiro tentar fazer uma visita ao bairro onde tinha morado a três anos atrás. Tinha três camaradas por lá que poderiam me dar abrigo. Mas advinhe, o primeiro tinha se mudado, o segundo estava viajando pra Aracajú e o terceiro tinha acabado de sair pra praia sem hora pra voltar (em Recife, o domingo praieiro de quem trabalha no comércio é na segunda, a praia lota!), encontrei só a esposa dele. Joguei conversa fora, atualizemos as fofocas e vazei.

Só tinha então uma chance, achar a casa de Petrúcio no bairro de Água Fria e rezar para todos os deuses para que tivesse alguém em casa. Após alguns pedidos de informação embarquei no ônibus PE 15 - Afogados e desci no primeiro ponto em que tinnha uma paisagem familiar. E andei, perguntei, andei, perguntei, perguntei e andei mais um pouco até que entrei em um bequinho que tinham me indicado e bati em uma porta de ferro verde. A tarde já estava no fim e a noite se avizinhava. Momentos de tensão. A porta se abriu e uma mulher falou:

- Timpin, seu doido, o que tu tá fazendo aqui?
Era Vera, esposa de meu compadre Petrúcio. Desabei nos pés dela sob o peso de minha mochila e exclamei do fundo dos meus esfumaçados pulmões:
- Estou salvo!!! Posso ficar aqui?
- Claro! Mas hôme, tú tá fedendo mais que cú de bode véio! De onde tú vem?
- Já te conto, posso tomar um banho?
- Deve!

Após um banho de quinze minutos e um sabonete, vesti uma bermuda que era dela (a topeira não tinha levado nenhuma) que só serviu amarrando firmemente com minha sinta, comprei dezoito latas de cerveja e nos pusemos a beber, conversar e ouvir música. Vera me apresentou o DVD da banda Kitara, a nova sensação brega do Recife. Sefhany e Larissa, as filhas do casal, pulavam no meu colo. Era eu de novo o Rei, o lorde de ascendência merovíngia que nunca deixei de ser.



Conversamos sobre nossos tempos no sertão nordestino. Era o fim do meu terceiro dia de viagem e parecia que fazia um mês que tinha saído de Curitiba.

1 comentários:

Que viagem foi essa rapaz!!!

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