sábado, 15 de agosto de 2009

Timpin & Hermano Vianna - O Ying & o Yang

O comentário que Jefferson Nunes fez lá na minha coluna Chimbinha & o Tecnobrega, merece uma resposta mais caprichada. Não a parte onde ele se refere a lixo musical e denigre diversos gêneros musicais populares, muito provavelmente sem nunca sequer ter escutado um disco com atenção, mas sim a parte em que se refere a Hermano Viana.



Sempre admirei o trabalho do Hermano. Na época em que ele lançou seu disco quádruplo Musica do Brasil, com o resultado de suas viagens pelo país inteiro gravando músicas folclóricas, passei quinze dias à base de pipoca e limonada para poder adquir o pacotão. No entando, desde seu programa Central da Periferia notei que muitas vezes ele erra, mesmo dotados das mais boas intenções. Que suas intenções são nobres, não tenho a mínima dúvida.


- Timpin, seu viadinho. Onde então ele erra?



Ele erra ao analizar a coisa de fora. Fazendo isso, involuntariamente acaba alimentando ainda mais os estereótipos, que acabam por reforçar o preconceito contra a cultura popular. No caso específico do tecnobrega, talvez o Jefferson tenha razão em chamá-lo de deslumbrado, de falar bem só porque não mora em Belém e nao é obrigado a ouvir aquele som diariamente. É só observar, os textos de Hermano Viana, parecem (e são!) os resultados das pesquisas de um antropólogo que no fundo, jamais faria aquilo que elogia como bonito. Hermano Vianna não escutaria um disco inteiro do Super Vetron ou do DJ Naelton, que são os discos que possuem as músicas que o povão realmente ouve.

Eu não sou assim e essa é a diferença fundamental entre o meu trabalho e o do Hermano Vianna. Eu escuto Super Vetron. Eu escuto Dj Naelton. Antes de escrever minha coluna sobre tecnobrega, escutei muitos discos e muitas vezes. Decorei letras, assimilei detalhes, escolhi meus favoritos, quase que minha esposa pede divórcio litigioso. Sábado, que é o dia em que faço minhas Imersões Auditivas, acabou sendo o dia em que os vizinhos determinaram como o correto e o apropriado para visitarem a sogra.



Enquanto a abordagem do Hermano Vianna é antroplógica e científica, a minha é Pop e intuitiva. Estou sabotando o trabalho dele afirmando isso? Não sei, espero que não. O público dele é mais acadêmico, o meu é mais lanhouseiro. A verdade é que preciso dizer isso pelo bem da minha honestidade para com meus leitores e da minha honra, meu travesseiro é muito mala, me cobra muitas coisas.

Pode ser que com esse texto eu esteja acabando de vez com qualquer chance de um contato com Hermano Viana. Falo isso porque já tentei e ele educadamente me dispensou. Penso que ele tenha feito isso ao ver que eu chamei sua esposa, Regina Cazé, de imbecil já na minha primeira coluna. Bem feito pra mim, quem manda não ter papas na língua.





Para tentar remediar possiveis mal entendidos, vou colar aqui o manifesto que ele redigiu na época da estréia do Central da Periferia. Texto longo, mas que merece ser lido.



Não tenho dúvida nenhuma: a novidade mais importante da cultura brasileira na última década foi o aparecimento da voz direta da periferia falando alto em todos os lugares do país. A periferia se cansou de esperar a oportunidade que nunca chegava, e que viria de fora, do centro. A periferia não precisa mais de intermediários (aqueles que sempre falavam em seu nome) para estabelecer conexões com o resto do Brasil e com o resto do mundo. Antes, os políticos diziam: "vamos levar cultura para a favela." Agora é diferente: a favela responde: "Qualé, mané! O que não falta aqui é cultura! Olha só o que o mundo tem a aprender com a gente!".

De um lado, há milhares de grupos culturais, surgidos na periferia, que em seus trabalhos juntam - de formas totalmente originais, e diferentes a cada caso - produção artística e combate à desigualdade social. Os exemplos da CUFA (Central Única das Favelas), que produziu o documentário Falcão, e do Afro Reggae, que inventou projeto para dar aulas de cultura para policiais, são apenas os mais conhecidos. Na maioria das periferias onde chego, em todas as cidades brasileiras, mesmo bem longe das capitais, encontro grupos muitíssimo bem organizados, com propostas de ação cultural cada vez mais surpreendentes. Para citar apenas mais alguns: a Fundação Casa Grande, de Nova Olinda (região do Cariri, interior do Ceará), com suas equipes de rádio e TV formadas por crianças e adolescentes; a ONG Altofalante, do Alto José do Pinho, Recife, com suas lições de rádio e hip hop; o Instituto Oyá, de Salvador; a Companhia Balé de Rua, de Uberlândia... Há muito mais.

Do outro lado, assistimos também ao nascimento de indústrias de entretenimento popular que já produzem os maiores sucessos musicais das ruas de todo o país sem mais depender de grandes gravadoras e grandes mídias para construir sua rede de difusão nacional. É o caso do funk carioca, do forró eletrônico cearense (as banda têm DVD, sugerindo o surgimento de uma indústria audiovisual que não está baseada em recursos captados pela Lei Rouanet), do tecnobrega paraense, do arrocha baiano, do lambadão cuiabano, da tchê music gaúcha. Todas essas músicas são produzidas na periferia para a periferia, sem passar pelo centro. O centro apenas reclama da sua falta de qualidade musical, mas não pode mais usar o argumento de que o povo está sendo enganado por uma indústria cultural hegemônica, já que a tal indústria cultural hegemônica não tem a menor idéia do que está se passando - e parece ter perdido totalmente o contato com o que realmente faz sucesso - na periferia.

O tecnobrega paraense, por exemplo, desenvolveu um novo modelo de negócios fonográficos que não precisa mais de gravadoras para se desenvolver. As músicas saem direto dos computadores dos estúdios periféricos e vão parar nos camelôs e no circuito das festas de aparelhagem (que animam as noites de fim de semana dos subúrbios de Belém, com suas toneladas de equipamento de som e luz hoje com controle totalmente digital). Laptops gravam tudo o que estiver tocando e os dançarinos podem comprar o CD - com tudo que acabaram dançar - na saída da festa. O aparecimento de usos locais para as novas tecnologias é cada vez mais veloz.

O pano de fundo para essa grande transformação das periferias não é apenas brasileiro, mas reflete uma tendência global. A população urbana do mundo hoje é maior que toda a população do planeta em 1960. O número de habitantes das grandes cidades cresceu vertiginosamente num período em que a economia da maioria desses centros urbanos estava (e continua a estar) estagnada, sem gerar novos empregos. Mesmo assim
a migração para as cidades não parou, e hoje - pela primeira vez na história da humanidade - há mais gente vivendo em cidades do que no campo. Calcula-se que mais de um bilhão de pessoas vivam atualmente em favelas de todos os países (os "chawls" da Índia, os "iskwaters" das Filipinas, os "baladis" do Cairo, as "colonias populares" do México, as "vilas" de Porto Alegre, os "aglomerados" de Belo Horizonte, e assim - quase infinitamente - por diante). Cerca de metade dessa população favelada tem menos de vinte anos. Quase todo mundo com trabalho informal.

É muita gente, jovem. Governos e grande mídia não sabem o que fazer diante dessa situação. Muitas vezes não sabem nem se comunicar com essa "outra" população, que passa a ser invisível para as estatísticas oficiais, a não ser para anunciar catástrofes. Essa gente toda vai fazer o que com oda sua energia juvenil? Produzir a catástrofe anunciada? É só isso que lhe resta fazer? Sumir do mapa para não causar mais problemas para os ricos? Em lugar de sumir, as periferias resistem - e falam cada vez mais alto, produzindo mundos culturais paralelos (para o espanto daqueles que esperavam que dali só surgisse mais miséria sem futuro), onde passa a viver a maioria da população dos vários países, inclusive do Brasil.

Esses mundos culturais periféricos não são homogêneos. O pessoal dos grupos culturais politizados (os que usam a cultura como arma contra as injustiças sociais) geralmente tem horror aos produtos bregas das novas indústrias do entretenimento periférico, considerado alienado, alienante e reprodutor de desigualdades. As duas visões de mundo parecem incompatíveis, inconciliáveis, mas acabam produzindo, nas mesmas favelas - mas cada uma a seu modo, as novidades mais vitais (e nisso não há um julgamento estético - apesar de na minha opinião essas novidades muitas vezes serem mais interessantes também esteticamente) da cultura brasileira como um todo.

A própria idéia de inclusão cultural tem que ser repensada - ou descartada - diante dessa situação. Quando falamos de inclusão, partimos geralmente da suposição que o centro (incluído) tem aquilo que falta à periferia (que precisa ser incluída). É - repito - como se a periferia não tivesse cultura. É como se a periferia fosse um dia ter (ou como se a periferia almejasse ter, ou seria melhor que tivesse) aquilo que o centro já tem (e por isso pode ensinar a periferia como chegar até lá, para o bem da periferia). É como se as novidades culturais chegassem exclusivamente pelo centro, ou fossem criadas no centro, e lentamente se espalhassem - à custa de muito esforço civilizador - em direção à periferia. Nos exemplos acima vemos que a periferia não esperou que o centro apresentasse as novidades. Sem que o centro nem notasse, inventou novas culturas (muitas vezes usando tecnologia de ponta) que podem muito bem vir a indicar caminhos para o futuro do centro, cada vez em pânico diante do crescimento incontrolável da periferia.

Quando viajo pelo Brasil, fora das zonas ricas e oficiais do eixo Rio-São Paulo (mas muitas vezes a apenas poucos passos dos seus centros de poder), fico sempre com a seguinte impressão: o minúsculo país cultural oficial, mesmo o retratado nos programas mais "populares" da mídia de massa, parece uma pequena e claustrofóbica espaçonave, em rota de fuga através de buracos negros, cada vez mais afastado do país real, da economia real, da cultura da maioria.

Do lado de fora (na realidade em todo lugar), as periferias das cidades inventam com velocidade impressionante novos circuitos culturais, e novas soluções econômicas - por mais precárias ou informais que sejam - para dar sustentabilidade para essas invenções. Presto atenção especial nos circuitos festivos, que sempre atraem multidões todos os fins de semana. Hoje, quase todas essas festas - conseqüência também do descaso do poder público e do desprezo dos bem-pensantes - proliferam na informalidade (quando não são literalmente criminalizadas, como é o caso dos bailes funk do Rio).

De certa forma, essa economia artística informal é produto de uma inclusão social conquistada na marra, quando a periferia deixa de se comportar como periferia, ou deixa de conhecer o "seu lugar", o lugar que o centro desejava que para sempre ocupasse (o lugar daquele que sempre espera ser incluído, que sempre acha que é do centro que virá sua libertação). O Brasil vai ter que se acostumar com essa "inclusão" forçada, de baixo para cima, feita assim aos trancos e barrancos. Enquanto isso o centro parece não conseguir deixar de lado esta nostalgia perversa de um país que "perdemos", quando os pobres e seus costumes "bregas" eram inaudíveis, a não ser num ou noutro livro de Gilberto Freyre (e Jorge Amado, é claro), ou num ou noutro filme de Glauber Rocha, ou numa noitada no Zicartola. O centro quer que a retirante nordestina ainda ande com vestido de chita, e não com shortinho e top de lycra, como manda o uniforme atual das periferias brasileiras...

Como cantam os Racionais MCs, periferia é periferia, em qualquer lugar. Essa letra é mais verdadeira do que nunca. Cada vez mais, a periferia toma conta de tudo. Não é mais o centro que inclui a periferia. A periferia agora inclui o centro. E o centro, excluído da festa, se transforma na periferia da periferia.

O Central da Periferia quer colocar todas essas questões em discussão, trazendo essa realidade periférica - e suas festas, e seus problemas - para a TV (mesmo tendo a humildade de saber que a cultura da periferia não precisa mais da TV para sobreviver). O nome do programa já é uma provocação, já abre o debate: hoje a fronteira entre o centro e a periferia - mesmo que o centro não queira, e que invista no apartheid cultural, no aprofundamento do abismo entre um lado e outro - rebola mais freneticamente que a egüinha pocotó do funk do MC Serginho. E queremos que rebole ainda mais.

O Central da Periferia não vai descobrir nada, não vai revelar nenhum novo talento desconhecido. A grande maioria das atrações musicais do programa é formada por ídolos de massa, já consagrados pelas multidões das periferias. Ou são projetos sociais que já influenciam decisivamente a vida de suas favelas, e contam com apoios internacionais. Mas que em sua maioria nunca apareceram na TV em rede nacional.

O Central da Periferia não quer falar por esses ídolos e projetos periféricos, mas sim abrir espaço para amplificar as múltiplas vozes da periferia, para que elas conversem finalmente com o Brasil inteiro. Você não precisa gostar de nada que o Central da Periferia vai mostrar. Você só não pode ignorar que isso tudo está acontecendo, e que essa é a realidade cultural da maioria, em todo o Brasil.

3 comentários:

Olha Tim,eu tentei ler o texto do Hermano na íntegra,mas é muito longo e metódico demais,li só alguns trechos,mas deu pra perceber o que falta em Hermano Vianna e o que sobra em seus textos.Emolgação de quem curte e escuta a música popular que toca na periferia!Deu pra perceber que o Hermano conhece a realidade da periferia do Brasil,por que estudou e viajou como turista por esse Brasilzão,porém o você vive isso no seu dia a dia Tim ,você está engajado com os ritimos populares por que faz parte disso,a diferença está aí!
Talvez seja por isso que mesmo você mesmo fazendo os seus "testamentos" enormeesss eu leio todos com satisfação,empolgação e dando otimas gargalhadas na maioria das vezes..rs.rs.rs..
Já com o texto do Hermano a coisa não fluiu,o texto é longo,muito metódico,parece uma tese,eu ainda vou lê-lo na íntegra assim que a preguiça me deixar rs..rs.r.s..
Mas achei importante comentar assim mesmo,antes de ler,justamente por que é ai que está a principal diferença.
Um autor só consegue se consagrar,quando faz um texto ou um livro que consegue prender a atenção do leitor do começo ao fim,e pra que ele consiga esse feito é preciso ter paixão e entusiasmo com a história que ele vai contar,ele precisa gostar muito do que está escrevendo e se envolver com os personagens que cria,e você faz isso Tim!
Já o Hermano não sei se realmente ele escuta todos os cds do Calypso,todas as músicas da Sthefany,o Tecnobrega...

Quanto ao perdão do Hermano caro Timpinho,pode esperar sentado se não vai cansar..Imagina chamar a dona patroa dele de imbecil?!..kkkkkkk
Só você mesmo, pra ainda esperar o perdão do cara...È muito cara de pau..kkkkkk

Aline e seus cometarios quer mercem posts. Soh que com esse nao farei isso porque jah andam dizendo que vc eh que eh a JABURACA e que usa o nome Aline como disfarce. Pior, dizem que ainda vamos casar! Pode?

CÊ tá é doido Homi..deixa meu marido saber dessa estória,que ele comete um assassinato,estamos fritos e mal pagos..kkkkkkk

Vou começar a postar como Anônima,é melhor se garantir né?!kkkkkk

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